quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Crônica de um reencontro

Na vida dele tudo caminhava de modo comum, com seus altos e baixos, mas comum.
Ela, por sua vez, recuperava a vida que perdeu por algum tempo, talvez por conta de uma escolha errada, mas agora se recompunha para voltar a sorrir.
Ele tinha seu trabalho e atividades. Ela com seus afazeres e estudos. E muitas dessas coisas que faziam separados era algo de gosto comum entre os dois.
Eles se falavam ocasionalmente, gostavam disso, se respeitavam, mesmo que não tivesse dado certo entre eles, mesmo que tudo que soubessem um sobre o outro é que estavam bem.
Houve uma viagem, ela estaria ali, na frente dele, mais uma vez. Ele sabia que seria bom revê-la pelo simples fato de gostar dela. Para ele, o esperado que, porventura pudesse acontecer, eram olhos nos olhos, dois sorrisos, um abraço apertado e as possíveis novidades. E então, ele foi ao encontro dela como um bom amigo.
Ele havia se preparado pouco, mas não sabia disso. Chegou, tocou a campainha e aguardou por alguns segundos com uma imagem já formada de quem ele estava por ver. Ela saiu, pareceu diferente da menina que ele conheceu e, de fato, estava. Ele não soube explicar o que era e nem se deu ao trabalho, estava feliz por vê-la e isso bastava. Pra ele, uma coisa era fato: ela estava linda como nunca.
Ela também parecia feliz, de bem com a vida, conversando, sorrindo. Ele, por sua vez, estava contente por vê-la bem e impressionado com a forma de como o diálogo fluía entre eles, isso o prendeu.
Ela agia como se estivesse em casa, com naturalidade. Ele, de alguma forma, se sentia encantado e atraído, não por beleza, mas por quem ele via e pela sintonia que existia ali. Encantado a ponto de se deixar levar.
Enquanto ela falava, ele olhava seus olhos, seu rosto, sua boca, seu jeito. Ah! O jeito dela, isso era uma coisa que o encantava definitivamente e, como se atraído por algum tipo de gravidade, ele se aproximava dela.
Ela sabia da intenção dele e, de alguma forma, ela não ficou surpresa, como se esperasse por isso, mas ao contrário do que poderia se imaginar, ela não correspondeu. Ele estava por entender o que se passava. E se querem saber, seu maior erro foi pensar que tudo continuava a mesma como antes. Ele sabia o quanto ela havia gostado dele e confiou que algo ainda estivesse ali, dentro dela, mas não estava, ou talvez estivesse, mas ela, diferente dele, soube dominar o que sentia. Enquanto ele se perguntava o por que ela hesitaria, ela o contou a história de como a vida havia sido dura e o quanto ela havia aprendido enquanto ele achava que tudo ia bem. Que ele se sentiu culpado é um fato. Pensou com ele mesmo, onde estava todo aquele tempo em que, talvez, pudesse ser útil pra alguém que era importante em sua vida. Ele se achava bom em dar conselhos, mas quando de fato poderia ser útil, não estava lá.
Ela sabia que não havia sido culpa de nenhum dos dois, e sabia também que ceder ao apelo do beijo não seria mais que superficial naquele momento. Ele entendia, por mais que não aceitasse, entendia que um beijo não faria com que tudo voltasse ao normal, não faria com que as experiências ruins fossem apagadas e insistir no beijo somente por insistir, seria egoísmo.
Ela, por mais que houvesse sido abalada pela situação, se mostrou firme em sua postura e opinião, sem pestanejar.
Ele ainda não sabia, mas cada contato feito naquela noite, cada olhar, cada abraço, mão dadas, ficariam marcados dentro dele.
Na mesma noite, ele confessara que era ao lado dela que ele gostaria de estar e somente dela. Ela insistia no pretérito imperfeito.
Não se sabe o que realmente passou na mente dela nessa noite, quais as reações, quais raciocínios. Ela aprendeu a se guardar, se proteger, talvez até demais, talvez não.
Ele ainda por entender, tão certo de que tudo do passado havia ido embora, ficado para trás e agora essa situação. Então ele supôs que talvez o passado deles houvesse realmente ido embora, era nada mais que lembrança. Agora ela era uma nova mulher, mulher pelo qual ele havia, inconscientemente, novamente, se apaixonado.
Ela havia conquistado novas amizades, novos afazeres, uma nova personalidade, mais forte e mais fria, havia construído um belo escudo em torno de si, se protegia das dores, frustrações, decepções. Mas esse mesmo escudo a impedia de ver os riscos que poderiam ser bons ela se fechou pra ele. Eu poderia ser imparcial, mas acho que ela estava certa, ele, mesmo que inconscientemente, achava que tinha meio caminho percorrido, meio jogo ganho, começou a construir pelas metades quando os alicerces precisavam ser totalmente refeitos.
Ele conseguiu enxergar isso depois de ver que, talvez, já não tivesse mais tanta importância na vida dela. Começou a procurar respostas dentro dele. Por vezes quis se colocar no lugar dela para tentar entender o que causara tanta mudança, e então, ele compreendeu a dor e o ataque sangrento a um ego vulnerável. Conseguiu entender e ter dentro dele a raiva, decepção e mágoa que ela sentiu. Quis ele ser a cura para isso e tentou de um modo um tanto quanto atrapalhado e desastroso, causou efeito, mas pra ela, era um efeito passageiro.
Durante determinado tempo ela havia recebido promessas, palavras carinhosas, olhos nos olhos, músicas, poemas, flores, carinho e um suposto amor. Todos esses quebrados em cacos que não se pôde colar. E então, mais uma vez, ele entendeu que, pra ela, os valores eram diferentes, por que os cacos haviam se quebrado e o que era belo havia sido feito em pedaços.
Ele tinha amigos que a julgavam por ela não corresponder a certos atos que, em outros casos, provavelmente surtiriam muito efeito. Ele sabia que, no ponto de vista deles, eles estavam certos. Mas ela tentava olhar as coisas do modo dela, ele enxergava isso. A única pessoa que ele conseguia culpar era o responsável por fazê-la parar de ver o brilho no que era lindo e de coração. Ele começou a culpar quem simulou a construção de bases sólidas de concreto e no final não era nada mais que uma casinha mal feita de papelão.
Ela já havia dado o veredito e não entendia o porquê ele insistia em entrar com recursos. Na verdade ele também não entendia, queria seguir seu coração, era no que ele acreditava, mesmo sem entender.
Antes que um ponto seja esquecido é preciso ser dito. Por mais que houvesse mais pontos em comum entre eles do que possamos comentar, havia uma dificuldade: distância física. Para ele, só um detalhe, para ela impossível de lidar.
Ela insiste em dizer que precisa de alguém perto, presente. Para ele, o ‘estar perto’ não tinha apenas a ver com o ‘estar ao lado’, mas sim com o ‘estar dentro’.
Ele pode confirmar isso em uma das vezes que se colocou em viagem para vê-la, para dizer o que tinha pra dizer de perto, queria comprovar sinceridade. Ele olhou para o todo da situação e viu que, em todas as tentativas de conversar, não teve mais que alguns minutos sozinho com ela, trinta, talvez quarenta. Percebeu também que mesmo estando ali, perto, ela conseguia o evitar. E então se confirmou: ele não estava dentro dela. Ela estava dentro dele, cravada, e ele havia cometido um erro que há muito tempo não cometia: havia se jogado na possibilidade e agora estava preso ao fato de a querer pra ele. Ela estava distante, mesmo ali, ao lado. Enquanto que, pra ele, mesmo longe, ela estava presente, pois estava dentro dele. E pela primeira vez em muito tempo ele chorou ao perceber a indiferença. Ele gostava da mulher que ela era, mas queria o sorriso e alegria da menina que outrora ele havia conhecido. Não era algo o qual ele precisava se expor, era uma opção dele, por isso não culpou ninguém. De todas às vezes, esse foi o único fato o qual ele não entendeu e nem poderia escrever a respeito mesmo tendo algum talento com palavras. Não entendia como seu veredito poderia ser dado em tentativas de quarenta minutos, com base em um passado que não existia. Ele queria mais, queria passar tempo, queria poder provar que sua companhia valeria a pena.
A não ser por falar de suas teorias ideialistas e cantar suas canções feitas pra ela sem nenhum efeito. Se sentiu preso, preso do lado de fora do abraço. Não teve essa chance.
Ela continuou com algumas lembranças que ele havia deixado, não se sabe o quanto ela pensou a respeito.
Ele queria um tempo pra colocar a cabeça no lugar, tentar esquecer por meio do tempo lhe pareceu uma boa saída. Ler livros, viajar, rever amigos.
Continuou escrevendo pra ele e para que outros pudessem ler e os temas sempre lembravam alguém. Talvez ele quisesse escrever sobre coisas que pudessem ajudá-la a se encontrar também, tentou primeiro compreendê-la para que depois pudesse explicá-la a ela mesma.
Ele, com sérias dificuldades, conseguiu se afastar e disfarçar um pouco do que sentia, ele queria respirar e deixar que ela respirasse, por entendê-la mais do que ninguém, ele se fez forte para agüentar mesmo achando, às vezes, que poderia explodir.
Nesse período, não houve um só dia em que ele não pensasse nela e em alguma forma de fazê-la pensar diferente. Ela estava ali, todos os dias, dentro dele e ele não podia tê-la, não tinha essa permissão. Pra ele tudo se resolveria caso essa permissão fosse concedida.
Soube-se que na última noite ele acordou assustado por ter um sonho ruim, ela estava nos braços de outra pessoa, fisicamente perto, não tão perto quanto ela estava dentro dele, mas ele nada mais poderia fazer, foi um choque.
Pela manhã percebeu que era só um sonho, agradeceu aos céus. Sabia que mesmo fora do sonho tudo que poderia fazer era esperar e, por falar em esperança, se lembrou que era seu aniversário e torceu pra que ele pudesse ter o que, pra ele, seria o melhor dos desejos concedidos: ela.


Vinícius Frade

terça-feira, 1 de novembro de 2011

E as cicatrizes?

Shen: Como encontrou a paz? Eu tirei seus pais de você. Tirei tudo. Eu deixei uma cicatriz incurável.
Po (Panda): A questão é essa Shen. Cicatrizes se curam.
Shen: Não, não se curam. Feridas se curam.
Po (Panda): Tá, e as cicatrizes? Fazem o quê? Somem?! É isso?!
Shen: Não tô nem aí pras cicatrizes.
Po (Panda): Mas devia, Shen. Você tem que deixar o passado pra trás porquê não tem mais importância. A única coisa que importa é quem você vai escolher ser agora.

(Diálogo retirado do filme 'Kung Fu Panda 2')

Pois é, apesar de ter sido retirado de um filme infantil, esse diálogo me chamou a atenção. De um lado Shen tentando entender como, apesar de todos os motivos que tinha, Po havia conseguido encontrar paz interior. Em outras palavras, havia superado seus traumas.
Po continua o diálogo dizendo que cicatrizes se curam, e Shen contra argumenta dizendo que são as feridas que se curam. Então surge a dúvida: 'E as cicatrizes? Fazem o quê?'. Sem nenhuma resposta, Shen ignora o fato das cicatrizes e surge a parte do diálogo que eu mais gosto onde Po fala que o passado deve ser deixado pra trás, porquê não tem mais importância. O que importa é de agora pra frente, o que você escolhe ser a partir de agora.
Com base nisso comecei a pensar: 'Quantas pessoas por aí se deixam ser tomadas por seus traumas, experiências ruins e com base nisso passam a viver o resto da vida, não se desprendem'. Essas pessoas usam como argumento ter vivido uma experiência que as ensinou algo. Mas como usar um argumento desse tipo se quando a situação muda todo o contexto também muda? Como usar uma situação passada para justificar uma escolha presente de contexto desigual? Por isso eu gostei da parte em que o Po fala que isso tem que ser deixado pra trás. Como se fosse não simples né, Vinicius?! Realmente não é. Essas experiências são gravadas em nossas memórias, ferem nosso ego, nossa auto-estima e passam a ser a única referência no futuro, como uma defesa, um escudo. Pra quem acha que isso é habilidade de defesa, de inteligência... cuidado, pode ser uma armadilha. Mas o fato é que você não deve deixar de fazer algo sempre que isso incomodar você, porquê se incomoda é porque ainda dói, se dói é porque a ferida anda aberta. Isso é prisão, é cárcere. Como se libertar disso, então?! Vou tentar parar de argumentar de modo vazio e me atrever (é atrevimento mesmo) a explicar (ou tentar explicar) cientificamente com base em uma teoria chamada 'Psicologia Multifocal'.

Quando alguém tem sua autocrítica e intuição trabalhados essa pessoas consegue explorar melhor sua mente e certamente será mais versátil e flexível pra enfrentar suas dificuldades, conseguirá ver ângulos diferentes de uma mesma situação. Caso contrário seus obstáculos serão gravados de uma maneira supervalorizada por um fenômeno da memória chamado RAM (Registro Automático de Memória). Formando, assim, zonas de conflitos, chamadas na Pscologia Multifocal de janela killer (por esse nome já da pra se ter uma idéia). As janelas killer são pequeníssimas áreas do córtex cerebral e nelas estão arquivadas nossos traumas, fantasias, fantasmas, crises, fobias, ciúmes, sentimentos de inveja, baixa auto-estima, timidez, complexo de inferioridade, de ser perfeito, entre outras coisas. Pra se ter idéia, o volume de ansiedade ao entrarmos em uma janela killer é tão grande que BLOQUEIA o acesso a milhares de outras janelas, impedindo que o 'Eu' encontre informações para construir pensamentos e idéias inteligentes. As janelas killer (ou zonas de conflitos), travam ou bloqueiam os códigos da inteligência, a lucidez, o raciocínio esquemático, a serenidade, a sabedoria, a racionalidade humana. Fazendo com que as escolhas de quem tem um trauma ou experiência não superados sejam, no mínimo, questionáveis.
Por outro lado, temos as janelas light que contêm as experiências de segurança, solidariedade, tolerância, generosidade, os prazeres, autoconfiança, auto-estima, a capacidade de se colocar no lugar dos outros. As janelas light, ao contrario das killer, promovem os códigos da inteligência. Essas janelas da memória são um território de leitura em um determinado momento existêncial (momentos do dia-a-dia, da vida). O seu desafio (e o meu) é abrir o máximo de janelas em um determinado momento gerando respostas lúcidas e coerentes. Entretanto, quando estamos raciocinando e entramos em uma janela killer, as experiências doentias que existem nela geram um volume de ansiedade tão grande que bloqueia o acesso às demais janelas. E assim, reagimos instintivamente, sem realmente pensar de modo inteligente, esquemático e criativo. Passamos a pensar instinto, proteção, de modo frio. Produzimos respostas irracionais, agressivas e débeis. Por exemplo se uma pessoa vê um raio caindo  e não interpretar o código da autocrítica fazendo-se saber que este é um fenômeno natural e filtrar o estímulo estressante (susto) que o raio pode causar, o raio deixará de ser apenas um fenômeno natural e passará a ser um fenomeno sobrenatural, será associado a um deus ou um monstro, gerando superstições, traumas e dogmas. E toda vez que um raio cair, sua janela killer será aberta e sua ansiedade, angustia, susto ou medo será extremamente valorizado por sua mente e o que seria naturalmente um raio passa a ser um 'monstro' ou 'deus'.  Parafrasiei e complementei Augusto Cury, 2008, 'O código da inteligência', pag 34. 

Só há uma maneira de amenizar tudo isso e é treinar e aguçar os códigos da inteligência. Por exemplo se você desenvolve o senso da autocrítica não dará um valor sobre-humano sobre as palavras, imagens ou opiniões de certas pessoas. Eu, Vinícius, por exemplo, descobri que desenvolvi o código da resiliência. 'Vinicius, o que é isso?!'. Vamos recorrer ao Google:  A resiliência é a capacidade de o indivíduo lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas - choque, estresse etc. - sem entrar em surto psicológico. Pode- se dizer ainda que a resiliência se trata de uma tomada de decisão quando alguém depara com um contexto de tomada de decisão entre a tensão do ambiente e a vontade de vencer.Essas decisões, propiciam forças na pessoa para enfrentar a adversidade. Assim entendido, pode-se considerar que a resiliência é uma combinação de fatores que propiciam ao ser humano condições para enfrentar e superar problemas e adversidades.

Ok? Podemos continuar? Então, eu de algum modo, desenvolvi a capacidade de superar certas adversidades e sempre continuar tentando. E esse é só um dos vários códigos que poderiam e deveriam ser desenvolvidos por nós (carisma, altruísmo, autocrítica, debate de idéias, intuição criativa). Pois então, se de um modo científico, pudermos explicar como as feridas são feitas em nós, é esse o modo, essa janelinha no córtex cerebral. Mas então supondo que a ferida se cure e fique somente a memória do que aconteceu, essa memória é a cicatriz e a questão lá em cima feita pelo Panda Po, não foi respondida ainda. 'E as cicatrizes?'. Bom eu diria que as cicatrizes são as marcas necessárias pra lembrarmos o que passamos, mas agora sem dor, sem medo de que algo toque naquele lugar, porque agora já não dói. E então eu, Vinícius, respondo a pergunta do pandinha: as cicatrizes são marcas que nos lembram que ali houveram feridas, mas elas se curaram e estão ali não como trauma, mas como lembrança de que passamos por dores, superamos e pudemos prosseguir com nossas vidas de forma saudável.

Só mais uma coisa, sabendo disso tudo pense bem quando estiver tomando deciões e fazendo escolhas, não use suas feriadas como base, tenha a cicatriz como referência sim, mas não como ponto principal. Aguce sua capacidade intelectual, autocrítica, inteligente e criativa. São esses códigos que vão fazer você analisar o que realmente é relevante.


Agradeço a leitura (:
Vinícius Frade